A Paixão

A Paixão Redescoberta: A Jornada de Spencer rumo ao Amor Autêntico na Psicanálise

Spencer é um advogado de 29 anos que se depara com uma incapacidade dolorosa de sentir e expressar amor por mulheres. Ele anseia por um tipo idealizado de companheira que possa perseguir sem o risco de desilusão e a ansiedade de um relacionamento real, como um cão que persegue um carro mas nunca o alcança. As relações de Spencer são superficiais e desapegadas; ele se esforça para agradar, mas no fundo sente ressentimento por suas parceiras.

Este padrão de comportamento é, em parte, um reflexo das dinâmicas familiares de sua infância. O relacionamento tenso e distante com sua mãe e a identificação com um pai desdenhoso das mulheres e do afeto moldaram a maneira como Spencer entende o amor e os relacionamentos. Ele evita a intimidade por medo da rejeição e, paradoxalmente, teme a solidão. Spencer repete o padrão de se afastar durante o dia, como fazia com a mãe, enquanto anseia por conexão e afeição à noite.

Em terapia, Spencer reflete esses conflitos, inicialmente buscando no analista uma figura masculina idealizada que pudesse espelhar e afirmar sua identidade. Com o tempo, ele avança em sua carreira e parece desenvolver uma independência superficial. No entanto, quando sua parceira pede casamento, ele aceita relutantemente, apesar de não identificar o que sente por ela como amor. Spencer continua a lutar com sentimentos de ser usado e não amado genuinamente, temendo tornar-se vulnerável ao afeto e à intimidade.

A história de Spencer exemplifica as dificuldades que alguns enfrentam ao tentar se apaixonar, onde o desejo e a busca por aprovação podem mascarar um anseio mais profundo por confirmação e identidade. Ele ilustra a complexa interação entre os desejos inconscientes formados na infância e a busca adulta por relacionamentos significativos e recíprocos.

A história de Spencer é um exemplo de como o amor pode ser complicado e confuso. Ele mostra que, às vezes, as pessoas têm dificuldade em se apaixonar de verdade porque estão presas em padrões antigos, repetindo comportamentos que as impedem de se conectar emocionalmente com alguém. Na linguagem da psicanálise, isso pode acontecer porque as experiências do início da vida, como a relação com os pais, não foram saudáveis ou completas. Isso pode levar alguém a buscar desesperadamente a aprovação ou o “espelhamento” – um tipo de validação – de um parceiro que parece sempre fora de alcance.

No caso de Spencer, ele repetidamente se identificava com o tipo de desejo que seu pai tinha – ou seja, ele se via como alguém que não podia ser alcançado, assim como ele via seu pai. Isso se tornou claro no casamento de Spencer, onde ele não conseguia se conectar verdadeiramente com sua esposa. Ele, e muitos outros, podem ter sido afetados pela maneira como suas famílias lidaram com questões como a sexualidade dos pais ou as histórias de suas próprias origens, que podem ter sido escondidas ou alteradas. Essas omissões podem complicar a capacidade de desenvolver uma identidade própria – ou “simbólica” – que é crucial para entender quem você é e como se relaciona com outras pessoas.

Quando se trata de tratar pessoas que têm essas dificuldades, os psicanalistas muitas vezes começam aceitando e participando dos padrões emocionais do paciente, o que pode ajudar a desvendar problemas mais profundos. Com o tempo, no entanto, eles precisam manter uma distância saudável e ajudar o paciente a ver que o analista é uma pessoa separada, não apenas um reflexo de seus próprios desejos. Isso pode ajudar o paciente a aprender a se relacionar com os outros de uma maneira mais saudável e realista, talvez até permitindo-lhes se apaixonar de verdade.

Entender a paixão e o amor através das ideias de Freud, Kernberg e Lacan – três grandes nomes da psicanálise – nos dá uma visão profunda sobre como as nossas primeiras relações na vida afetam nossas relações amorosas mais tarde. Eles sugerem que o amor envolve encontrar um equilíbrio entre os nossos desejos mais primitivos e a capacidade de se relacionar verdadeiramente com outra pessoa como um ser separado e único. O amor não é apenas um sentimento, mas um processo complexo que pode ser afetado por muitas coisas diferentes, desde a nossa infância até a maneira como lidamos com desapontamentos e desejos não realizados.

A Paixão através das Lentes de Freud e Lacan

A história de Spencer nos permite mergulhar nas profundezas do amor e da paixão sob a perspectiva psicanalítica. Freud teria visto o dilema de Spencer como um conflito entre o id, que busca prazer sem limites, e o superego, que se esforça por comportamentos moralmente aceitáveis. O ego de Spencer, preso no meio, é incapaz de reconciliar essas forças opostas, levando a uma incapacidade de se entregar ao amor por medo de vulnerabilidade e perda de controle.

Lacan, por outro lado, enfatizará o papel do “estágio do espelho” na formação do ego de Spencer. A constante busca de Spencer por um ideal inatingível e a incapacidade de encontrar satisfação nas relações amorosas refletem um desejo de completude que remonta à sua primeira identificação com a imagem no espelho. Seu relacionamento com sua esposa e suas relações passadas podem ser vistas como tentativas de preencher esse vazio, um reflexo da falta primordial que Lacan acredita ser central para a experiência humana.

Ambos, Freud e Lacan, concordam que a paixão é uma força poderosa que pode tanto enriquecer a vida quanto causar grande sofrimento. No caso de Spencer, a paixão permanece frustrada e inalcançável, mascarada por uma série de relações superficiais. O trabalho psicanalítico pode ajudar Spencer a reconhecer e compreender os desejos inconscientes formados na infância, permitindo-lhe finalmente buscar relações mais significativas e recíprocas.

A paixão, portanto, é um fenômeno complexo que transcende a simples atração. É um caldeirão de desejos primitivos, conflitos internos e o anseio por uma conexão genuína e recíproca. É o motor que nos impulsiona em busca de completude, mas também pode ser a fonte de nossa maior angústia quando os padrões inconscientes nos mantêm presos em ciclos de desejo não realizado. Spencer, como muitos, está no caminho para desvendar esses mistérios internos, um caminho que é difícil, mas essencial para alcançar a capacidade de amar plenamente.

Um psicanalista, guiando-se pelas teorias de Freud e Lacan, abordaria os ciclos de sofrimento nas paixões de uma maneira que combina entendimento profundo com intervenção terapêutica. Aqui estão algumas estratégias que um psicanalista poderia empregar:

  1. Exploração do Inconsciente: A psicanálise começa com a exploração das experiências do início da vida da pessoa para descobrir como essas experiências moldaram a percepção atual de relacionamentos amorosos. O terapeuta ajudaria o paciente a revelar padrões inconscientes que repetidamente levam a escolhas que causam sofrimento.
  2. Identificação de Padrões Repetitivos: Juntos, o psicanalista e o paciente trabalhariam para identificar e compreender os padrões repetitivos de comportamento, pensamento e escolha que conduzem ao sofrimento nas paixões. Isso pode incluir olhar para a escolha dos parceiros e a natureza das interações com eles.
  3. Confrontação com a “Falta” (manque): Lacan enfatiza que a falta é uma parte inevitável da condição humana e que o desejo de preencher essa falta pode ser uma força motriz por trás da paixão. O psicanalista ajudaria o paciente a reconhecer e aceitar essa falta, em vez de procurar incessantemente preenchê-la de maneira imprópria.
  4. Transferência e Contratransferência: A relação única entre o psicanalista e o paciente é usada como um microcosmo para as relações externas do paciente. As reações do paciente ao terapeuta podem revelar padrões importantes relacionados à paixão e ao sofrimento.
  5. Reestruturação do Ego: O psicanalista orientaria o paciente a fortalecer o ego, permitindo-lhe uma melhor regulação dos impulsos do id e uma crítica mais realista das expectativas do superego. Isso ajuda a pessoa a fazer escolhas mais conscientes e saudáveis em seus relacionamentos.
  6. Trabalho com o Complexo de Édipo: Na teoria freudiana, os conflitos não resolvidos do Complexo de Édipo podem desempenhar um papel nos padrões repetitivos de sofrimento nas paixões. Resolver esses conflitos pode levar a relacionamentos mais maduros e satisfatórios.
  7. Integração do Amor Simbólico: O terapeuta ajudaria o paciente a se mover além do amor narcísico ou do espelho, encorajando o desenvolvimento de um amor simbólico, no qual o outro é reconhecido como um sujeito separado e onde o amor pode ser expresso de maneira saudável.
  8. Aceitação e Crescimento: Encorajaria o paciente a aceitar que o crescimento pessoal frequentemente vem com a dor e a frustração, e que essas experiências podem levar a uma maior autocompreensão e maturidade emocional.

Em última análise, o psicanalista forneceria um espaço seguro para o paciente explorar seus sentimentos mais profundos, ajudando-o a entender e transformar a dor da paixão em uma oportunidade de crescimento pessoal e relacionamentos mais significativos.

Marcelo Paschoal Pizzut

Em meio às incertezas da vida, encontre amor em cada gesto, esperança em cada amanhecer e paz em cada respiração. Acredite no poder do amor para unir corações, na esperança para superar desafios e na paz interior para irradiar harmonia ao mundo. Que o amor nos guie, a esperança nos inspire e a paz nos envolva em todos os momentos da jornada. Que essas três preciosidades sejam nossa força para construir um mundo melhor. Ame, espere e viva em paz.
Marcelo Paschoal Pizzut
Psicólogo Clínico

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