Cannabis e Psicose: Neurobiologia Parte 3

 Interações Farmacológicas e Prejuízos Cognitivos Induzidos por Cannabis

O uso de cannabis tem sido mostrado para alterar a cognição de várias maneiras, e o papel do sistema endocanabinoide nessas mudanças é evidente. As propriedades psicoativas da cannabis, principalmente atribuíveis ao THC, interagem com o sistema endocanabinoide no cérebro, que é generalizado e afeta uma infinidade de processos neurais.

O receptor CB1 é predominantemente encontrado no SNC, particularmente em regiões associadas à cognição, como o córtex pré-frontal, hipocampo, gânglios basais e cerebelo. A ativação desses receptores pelo THC leva à inibição da liberação de neurotransmissores, o que pode perturbar o equilíbrio normal da neurotransmissão e alterar as funções cognitivas. Especificamente, essas interrupções podem afetar memória, atenção e função executiva, conforme demonstrado por estudos comportamentais e de imagem.

Além disso, os receptores CB1 modulam a liberação de outros neurotransmissores, incluindo dopamina, GABA e glutamato. Por exemplo, a liberação de dopamina induzida pelo THC, especialmente no estriado, tem sido associada aos seus efeitos psicomiméticos, fornecendo potencialmente uma ligação entre o uso de cannabis e o aumento do risco de psicose.

O componente CBD da cannabis, no entanto, mostrou ter um efeito diferente e muitas vezes oposto ao THC. Enquanto o THC é conhecido por seus efeitos intoxicantes e potencial para prejudicar a cognição, o CBD mostrou potenciais efeitos neuroprotetores e pode contrariar alguns dos impactos cognitivos negativos do THC. Isso destaca a importância de considerar a relação THC:CBD em diferentes cepas e produtos de cannabis, que podem influenciar significativamente os efeitos cognitivos da droga.

Consumo Crônico e Potencial para Recuperação

Preocupações sobre o uso crônico de cannabis, especialmente quando iniciado durante a adolescência, giram em torno de seus potenciais efeitos a longo prazo na cognição e estrutura cerebral. Estudos sugerem que indivíduos que começam a usar cannabis pesadamente durante a adolescência exibem déficits cognitivos mais pronunciados do que aqueles que começam a usar a droga na idade adulta.

No entanto, permanece a questão: esses déficits cognitivos são reversíveis? Algumas evidências sugerem que, após períodos prolongados de abstinência de cannabis, pode haver uma recuperação em certos domínios cognitivos, mas não em todos. Um estudo longitudinal descobriu que indivíduos que haviam parado de usar cannabis por mais de um mês mostraram melhorias na memória e atenção em comparação com os usuários atuais. No entanto, alguns déficits cognitivos, particularmente no domínio da tomada de decisão e formação de conceitos, podem persistir mesmo após a cessação prolongada.

Conclusão

Embora a relação entre cannabis, cognição e psicose permaneça complexa e multifacetada, está claro que a cannabis pode impactar a função cognitiva. A variabilidade nos resultados entre estudos pode ser atribuída a diferenças nas metodologias, nos domínios cognitivos específicos testados, na relação THC:CBD da cannabis consumida e em diferenças individuais em genética e estrutura cerebral.

Embora algumas mudanças cognitivas associadas ao uso de cannabis possam ser transitórias e se recuperar com a abstinência, outras podem ser mais duradouras. Os potenciais riscos associados ao uso de cannabis, especialmente o uso pesado desde uma idade jovem, justificam mais pesquisas e consideração de saúde pública. Importante, à medida que a tendência à legalização da cannabis continua globalmente, é crucial fornecer ao público informações precisas e abrangentes sobre os potenciais benefícios e riscos associados ao consumo de cannabis.

Marcelo Paschoal Pizzut

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Marcelo Paschoal Pizzut
Psicólogo Clínico

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