É a ferida que dói e não se sente

É Ferida que Dói e Não se Sente: Vivendo com Transtorno de Personalidade Borderline

Tudo com amor fica melhor. Essa é uma verdade que transcende propagandas e slogans, como o famoso bordão do Sazon. O amor é a argamassa que sustenta relacionamentos, dá sentido aos dias difíceis e nos conecta uns aos outros. Para quem vive com o Transtorno de Personalidade Borderline (TPB), o amor pode ser tanto uma força transformadora quanto uma ferida que dói e não se sente, como diz o trecho de Fado Tropical, de Chico Buarque. Nesta postagem, quero compartilhar minha jornada com o TPB, explorando como o amor – por si mesmo e pelos outros – pode ser a chave para enfrentar os desafios dessa condição e encontrar equilíbrio.

O que é o Transtorno de Personalidade Borderline?

O Transtorno de Personalidade Borderline é uma condição de saúde mental marcada por emoções intensas, relacionamentos instáveis e uma autopercepção flutuante. Segundo o National Institute of Mental Health, o TPB afeta cerca de 1,4% da população adulta, geralmente se manifestando na adolescência ou início da idade adulta. Quem vive com TPB pode experimentar mudanças rápidas de humor, medo intenso de abandono e dificuldade em regular emoções, o que transforma o cotidiano em uma montanha-russa emocional.

Para mim, o TPB é como uma ferida invisível – uma dor que está lá, mas nem sempre é fácil de explicar ou compreender. Um pequeno evento, como uma mensagem não respondida, pode desencadear uma tempestade de sentimentos, da euforia ao desespero. No entanto, com apoio profissional e estratégias de enfrentamento, é possível transformar essa dor em uma jornada de autoconhecimento e crescimento.

Minha Jornada com o TPB

Há alguns anos, minha vida parecia um ciclo interminável de altos e baixos emocionais. Relacionamentos eram frágeis, minha autoimagem mudava constantemente, e eu sentia uma dor que não conseguia nomear. Quando recebi o diagnóstico de TPB, senti alívio e medo ao mesmo tempo. Alívio por finalmente entender o que estava acontecendo; medo por não saber como seguir em frente. Era como se o amor, que deveria ser uma fonte de alegria, tivesse se tornado uma ferida que doía sem que eu pudesse tocá-la.

Com a ajuda de um terapeuta, comecei a explorar essa dor. A Terapia Comportamental Dialética (TCD), desenvolvida por Marsha Linehan, foi fundamental para me ensinar a identificar gatilhos, pausar antes de reagir impulsivamente e construir uma relação mais saudável comigo mesmo. O amor, que antes parecia um peso, tornou-se uma ferramenta de cura – especialmente o amor-próprio.

Sintomas do TPB: A Dor Invisível

O TPB é como uma melodia complexa, com notas de intensidade, vulnerabilidade e busca por conexão. Aqui estão alguns sintomas comuns, conforme descrito pela Mayo Clinic, adaptados para o contexto:

  • Medo de abandono: Uma preocupação intensa de que pessoas importantes irão partir, levando a comportamentos de apego excessivo ou afastamento preemptivo.
  • Relacionamentos instáveis: Conexões que oscilam entre idealização e desvalorização, como uma dança entre amor e conflito.
  • Autopercepção instável: Uma sensação de não saber quem você é, como se sua identidade fosse uma ferida em constante mudança.
  • Comportamentos impulsivos: Ações como gastos excessivos, uso de substâncias ou automutilação, muitas vezes como forma de aliviar a dor emocional.
  • Instabilidade emocional: Mudanças rápidas de humor, desencadeadas por eventos menores, que intensificam a sensação de dor invisível.
  • Sensação de vazio: Um sentimento persistente de hollow, como uma ferida que não explica sua origem.
  • Raiva intensa: Dificuldade em controlar a raiva, que pode levar a explosões ou conflitos.

Esses sintomas tornam o TPB uma condição desafiadora, mas não intransponível. Para mim, o maior obstáculo era reconhecer que essa dor não me definia – ela era parte de uma condição que eu podia aprender a gerenciar.

O Amor no Contexto do TPB

Tudo com amor fica melhor, mas com o TPB, o amor pode ser uma faca de dois gumes. Ele é a energia que nos conecta, mas também pode intensificar nossas inseguranças. Já vivi relacionamentos em que o medo de abandono me fazia agir de forma impulsiva, criando conflitos onde não havia necessidade. Com o tempo, percebi que o amor verdadeiro começa com o respeito – por mim mesmo e pelo outro.

Esquecemos, muitas vezes, que a pessoa ao nosso lado é um indivíduo com sonhos, desejos e necessidades próprias. No TPB, é fácil focar no que nos falta – atenção, validação, segurança – e ignorar o que o outro precisa. Aprendi que um relacionamento saudável exige diálogo, paciência e a disposição de ouvir. O amor pode se abrandar com o tempo, mas, como diz o texto original, ele pode se transformar em algo ainda mais forte: o companheirismo.

Relacionamentos: O Desconhecido Conhecido

Quando decidimos compartilhar a vida com alguém, abrimos a porta para um “desconhecido conhecido”. Essa expressão, embora estranha, reflete a realidade do TPB. Conhecemos nosso parceiro, mas suas reações, sonhos e mudanças ao longo do tempo podem nos surpreender. No meu caso, o TPB amplificava essa sensação de desconhecimento, tornando cada conflito uma ameaça à minha identidade.

Com terapia, aprendi a ver o outro como um parceiro, não como uma extensão de mim mesmo. Isso significou reconhecer que meus medos de abandono eram parte do TPB, não uma verdade absoluta. Construir um relacionamento com TPB exige paciência e compreensão mútua, mas é possível quando ambas as partes estão dispostas a trabalhar juntas.

Estratégias para Lidar com o TPB

Viver com TPB é como navegar por mares tempestuosos, mas há estratégias que podem nos guiar a um porto seguro. Aqui estão algumas que me ajudaram:

  • Terapia Comportamental Dialética (TCD): A TCD me ensinou a regular emoções, tolerar o estresse e melhorar minha comunicação. É como aprender a navegar com um mapa confiável.
  • Autocuidado: Práticas como meditação, exercícios físicos e escrita me ajudam a manter o equilíbrio. Escrever este blog é uma forma de processar minha dor e transformá-la em algo construtivo.
  • Rede de apoio: Amigos e familiares que entendem o TPB são como âncoras que me mantêm firme nos dias difíceis.
  • Comunicação aberta: Expressar sentimentos sem culpar o outro é essencial. Em vez de dizer “você me ignora”, agora tento dizer “estou me sentindo inseguro e preciso conversar”.
  • Jornal de emoções: Anotar pensamentos e gatilhos me ajuda a identificar padrões e planejar respostas mais saudáveis.

Essas estratégias não eliminam a dor do TPB, mas ajudam a transformá-la em algo que podemos compreender e gerenciar. O amor-próprio, em particular, foi a chave para encontrar paz em meio ao caos.

Conclusão: O Amor como Porto Seguro

Todos queremos ser felizes, ter paz e construir uma vida plena. Com o TPB, essa busca pode parecer uma ferida que dói e não se sente, mas também é uma oportunidade para crescer. Hoje, estou solteiro, mas não sozinho. Tenho minhas amizades, meu gato e este blog, que me permitem compartilhar minha jornada e inspirar outros.

Se você vive com TPB, saiba que sua dor é válida, mas não te define. Busque ajuda profissional, conecte-se com quem te entende e acredite que o amor – por si mesmo e pelos outros – pode ser a argamassa que sustenta sua vida. Como diz a música, é uma ferida que dói, mas também é o amor que nos guia ao porto seguro. Continue navegando, porque sua história merece ser vivida com coragem e esperança.

Marcelo Paschoal Pissuto
Psicólogo e Professor de Inglês

O Prof. Marcelo leciona inglês há 20 anos e ministra suas aulas via internet através de Skype, ajudando profissionais a se expressarem em outro idioma. Além disso, há cinco anos atua como psicólogo, atendendo clientes via Skype para maior comodidade. Marcelo também mantém um site voltado para autoajuda e psicologia, compartilhando pensamentos, ensinamentos e técnicas para o bem-estar.

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